top of page

Manaus

Atualizado: 13 de jan.

I

Ah, Manaus* antiga de coisas lembradas

de amigos que outros rumos tomaram

uns para o mundo, outros, eternidade

reminiscências livres e tantas saudades.


O Café era da paz a Leiteria mimosa

o pão doce a coalhada do Careiro

o pirão escaldado o aipim macaxeira

Autazes amanteigava o pé-de-moleque.


xarope de guaraná, cerveja, maroca, XPTO

o metrô, o bonde que ia aos bilhares

da Fábrica de Cerveja ao Ferro de Engomar

a curva que era da morte e a baixa da égua.


o Solar da Olímpia, o vermelho 27 BC

o Cheik era na sombra do Hotel Amazonas

o boi Corre-Campo e o plano inclinado

drogarias Rosa e Fink e a casa amarela.


Na Tropical o piano era ao cair da tarde

o ouvinte disc-jóquei, a crônica do dia

com domingos sua manhã era de domingo

do broto de dez ao jovem de noventa anos.


O igarapé do 40, o Parque 10 de Novembro

a 13 e 24 eram de Maio e a 15 de Novembro

a Municipal passou a ser a 7 de Setembro

a 3.900 virou 4.400, e 100 mil paletós


a esquina das sedas, o canto do fuxico

a luz vinha do navio e também na Balbina

o porto das catraias, o navio gaiola,

o avião da Panair pairava no rio Negro.


                                II

Waldick, nosso Sinatra, Ângela, a Pelada

Lado ao Lado era ilharga da tua ilharga

Suave era a Noite, a Balada Triste

a Ternura antiga e a Tortura  Amor.


Manaus onde o Brasil era um Bar; Botafogo,

uma  sapataria, Vasco vendia o disco voador,

Flamengo era pente, para jogar botão feito

de caroço de tucumã. Aquilo que era jogo!


Ia-se da adega Portuguesa ao Canto da Alvorada

do Restaurante Central à Pensão Maranhense

e Bar Avenida ao Bife de Ouro ou Baratinha

se a grana era pouca a opção era o Guadalajara.


Água, Luz, Porto, Banco e Bondes, beleza

cria  dos Ingleses, que viviam em Adrianópolis

que  ia do Reservatório a Magistral, Nordestino

de São Luís a Salvador, passando em Fortaleza.


Cachoeirinha recitava os municípios amazonenses

de Itacoatiara a Ipixuna, de Parintins a Silves

Joaquim Sarmento, Itamaracá e adjacências eram

As áreas de trabalho das Operárias Amor-zonenses.


Os cines preferidos pela galera eram o “Ideal” e “Poeirão”

matinê: no Avenida e no Odeon, seriados: Guarani.

Os bois-bumbás eram: Corre-Campo, Mina de Ouro

Tira-Prosa e o Pássaro mais famoso era o corrupião.


Futebol: Clássico era jogado no Parque Amazonense,

e Colina. Labor, Duca Brito e Parque 10: peladas.

Azedos, Tapioca e Tiririca jogavam no Sul América,

Purgante, no Fast, Catita e Bololô, no rio Negro.


                                        III

Atravessar para os Educandos e São Raimundo

Só na catraia e muitas vezes a volta: na porrada

a cidade era fresquinha por causa dos igarapés

paralelepípedos, benjaminzeiros e mangueiras.


O Colégio Estadual era Ginásio Dom Pedro II.

O Instituto de Educação era a Escola Normal

Doroteia, Santa Terezinha e Maria Auxiliadora

eram das meninas o Dom Bosco, dos meninos.


Rosa de Maio desfolhava o ano todo

o bar Bom Futuro, ficava no clima frio,

Rapariga frequentava até piscina

Ângelo e Verônica: viviam separados.


És a Vitória-régia que brilha em nossos igapós

Rosa cabocla flor de baunilha graça de todos nós

assim era festejada a nossa miss Amazonas

que também tinha a cor e o sabor de morango.


O Curtume Canadense, a La ville de Paris

a Boate dos Ingleses, o Chapéu Panamá

fato HJ, a camisa banlon, calça de nycron

o vestido de organdi, o perfume 1010.


O Felipe, geleiro; Flaviano goleiro,

o  JS Amorim JG Araújo o JA leite,

Pavão, Asdrúbal e Aníbal no Vôlei

e o Mário Orofino no Futebol Tijucano


O óleo de fígado de Bacalhau, o Fimatosan

a Emulsão Scott, o regulador Xavier

Pílula de vida do Dr. Ross, elixir paregórico

Antisardina e antibiótico no Dr. Altayr.


                                 IV

O bonde era de Flores, ou dos Remédios

tinha o ferro de engomar que fazia o Circular

tinha o da curva da morte e o da Saudade

todos eles ajudavam no cerol para empinar.


Maria era das patas e Chica Bodó

e piranha se comia até no caldo.

hoje estão emprestando pra  elas, as

das quebradas começarem a Dasló.


E o aeroporto era ponta pelada

o Uirapuru e o Guadalajara, peixarias

o Virgílio, vinagre a lavanderia Lavatex

Luzia virou Luseia, a Voz, Bariceia.


São Marcos: Botequim; Santa Clara, pastel

Santa Etelvina, bairro, Joana, macumbeira

nem o diabo foi esquecido, é pobre mas

possui uma Igreja e já teve até delegado.


O instituto de Beleza de Messody Henriques

com o apoio de Cirineu, comandava a beleza

fazendo o permanente nas damas amazonenses

sem discriminar, meninas Dazona e Dapureza.


Na intimidade dá-lhe de corpete e bustiê

e vinham as cinco anáguas bem engomadas.

Feio mesmo eram os bob`s com rendinha

que usavam na cabeça antes do laquê.


Os homens cortavam cabelo nos  barbeiros

na galeria JG tinha o Fígaro do Rei

com Seu Gerson, Osmar e Raimundo

chapéu, lenço e galocha só na Goulart.


                                 V

O sapato, de última novidade, na Arone.

Que oferecia do pneu ao cromo

alemão, passando pelo seguro Vulcabrás

conga, chuteira ou de salto, motinha.


Caneta era Parker 51, comprada no médico.

Poupança? Cooperativa Banco Popular

e estrangeiro tínhamos o London Bank.

Mas o dos portugueses era o Ultramarino.


O centro da cidade ficava na ponta

tínhamos a Central de Ferragens,

o restaurante, o hotel e a garagem

mas a que dava medo era a de polícia.


Dragão tinha a sua casa e vendia tecidos

Pequeno Príncipe cuidava do masculino

os Velhos Lino e Lucena eram dos papéis.

e a Globo em Manaus era uma Tabacaria.


Professora: Mestra, não tia ou facilitadora

respeito era no olhar. Diretoria? Terror!

Tabuada aprendia-se mesmo na palmatória

Castigo era “de joelhos” ou “chame seu pai”


Os árabes nos municípios dominavam. Eram:

Assef, Abrahim ou hão, Nasser, Cheuan,

Azize, Haddad, Chible, Mansur, Chamma

Gorayeb, Hauache, Bichara, Said e Mussa.


Os judeus que comandavam o comércio,

atacadistas, varejistas e extrativistas

tinha Sabbá, Benchimol e Levy

Benzecry, Assayag, Bentes e Pazuello.


                                  VI

A gente sabia: tristezas não pagam dívidas

que a Maria, coitadinha, vai com as outras

leso era o abestado que não estava nem aí!

As meninas cunhantãs, os menos curumins.


Aqui as vogais prevalecem pra chuchu

Tacacá, aluá, tracajá, tucunaré, cafuné,

Tucupi, uarini, tucuxi, janauari, arari,

Acari e forró bodó, pacu, até pirarucu.


Manaós, dos abricós, arigós e igapós

Manaus, dos aracus, candirus e anus

Manauense dos belenenses, cearenses,

Manauara, das iaras, cigarras e araras.


Manaus, a cidade dos nobres bares

das cunhantãs, dos igapós e igarapés

de um passado romântico e sossegado

que o tempo deixou pra trás... nunca mais...


*Transcrito do livro “Manaus meu sonho”, organizado por José Joaquim Marques Marinho, Manaus: Editora Valer, 2010, 144 pp.



Manaus, Av. Eduardo Ribeiro. Foto: Internet, 11/01/2025.
Manaus, Av. Eduardo Ribeiro. Foto: Internet, 11/01/2025.

Comments


bottom of page